“…Tem direito de cantar, de se expressar e de incomodar”

22 fev “…Tem direito de cantar, de se expressar e de incomodar”

A música sempre foi, ao longo da história da humanidade, instrumento da liberdade de expressão, e nem sempre o tom adotado é condizente com os padrões da “moral e dos bons costumes”. Já no ano de 1859, a ópera “La Traviata”, de Giuseppe Verdi, expunha em suas letras referências à prostituição, ao prazer sexual, ao consumo exagerado de bebidas alcoólicas. É inimaginável que tamanho ícone da cultura erudita tenha sido objeto de censura, porém as óperas de Verdi se passavam em outros locais da Europa exatamente para driblar o rigoroso controle moral nas pequenas nações que formariam a Itália.

No Rio de Janeiro do século XX, ostentar um pandeiro nas ruas cariocas podia dar cadeia, pois o samba era visto com maus olhos pela elite política da época. Até ser reconhecido como patrimônio nacional por Getúlio Vargas, as rodas de samba eram criminalmente enquadradas como atos de “vadiagem”. A história se repetiu várias vezes, com várias tentativas de criminalização de estilos musicais, como foi o caso de um projeto de lei de iniciativa popular de 2017, que tentou criminalizar o funk. Novamente em 2019, o Congresso Nacional volta a debater sobre o tema.

O Projeto de Lei nº 5194/201, de autoria do deputado Charlles Evangelista (PSL-MG), pretende criminalizar estilos musicais que trazem conteúdos “ofensivos,” como palavrões e xingamentos. O projeto não cita especificamente nenhum estilo musical, mas poderia resultar na censura a diversos estilos como o funk, o rock, o rap e o hip hop. As expressões consideradas inadequadas pelo documento incluem letras que estimulem algumas práticas, como o uso de drogas, armas, pornografia, ou alusões a pedofilia, estupro, ofensas à imagem da mulher ou ódio à polícia e ao Estado. A intenção do deputado seria “garantir a saúde mental das famílias e principalmente das crianças e adolescentes”

O desfecho do projeto, como dos outros que o antecederam, é previsível, porquanto caso realmente se tornasse lei, certamente seria declarada inconstitucional por violação aos princípios da livre manifestação do pensamento, da liberdade artística e à vedação à censura prévia.

Mas afinal, a apologia musical a temas como drogas, prostituição, estupro, pedofilia ou a crimes em geral, não seria pretexto para se impedir sua veiculação? Ou estaria o direito à livre expressão artística num patamar acima, ainda que incomodasse a ouvidos mais sensíveis? Deixemos a conclusão para o leitor, que “tem direito de opinar, de criticar e de contestar”.

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REFERÊNCIAS

https://g1.globo.com/musica/noticia/projeto-de-lei-de-criminalizacao-do-funk-repete-historia-do-samba-da-capoeira-e-do-rap.ghtml – acessado em 04/10/2019

https://rollingstone.uol.com.br/noticia/alguns-estilos-musicais-podem-virar-crime-no-brasil-devido-projeto-de-lei/ – acessado em 04/10/2019

http://www.obomdanoticia.com.br/brasil-mundo/deputado-do-psl-cria-projeto-que-criminaliza-estilos-musicais-como-o-funk/25472 – acessado em 04/10/2019

https://portalrapmais.com/rap-e-funk-podem-ser-criminalizados-no-brasil/ – acessado em 04/10/2019